Com o Papa Francisco em Erbil (Iraque)

Lito Articona é filipino e vive no Iraque há 6 anos; neste artigo conta os bastidores da última visita papal

Quando soube em dezembro que o Papa Francisco planejava visitar o Iraque em março de 2021, a primeira coisa que pensei foi que os cristãos iraquianos, mais do que qualquer outro povo, mereciam este encontro paterno com o Vigário de Cristo.

Eu sou filipino, membro do Opus Dei e trabalho como um expat em Erbil já faz 6 anos. Comecei sendo Gerente de Segurança e Garantia de Qualidade no Aeroporto Internacional de Erbil de 2015 até 2019. Agora sou Gerente de Projetos do Escritório de Relações Internacionais da Arquidiocese Caldéia de Erbil. Uma das minhas responsabilidades é monitorar o apoio financeiro dado por grandes instituições humanitárias ao redor do mundo com o objetivo de preservar o Cristianismo no Iraque para que, como Sua Santidade descreve, a Igreja Mártir não apenas sobreviva – mas também floresça.

Testemunhar em primeira mão a devoção de famílias cristãs à tradição aramaica (caldeia) tem sido muito inspirador para mim. Aqui, frequentemente as pessoas mencionam em conversas que o Cristianismo esteve presente no Iraque desde Pentecostes, dois mil anos atrás.

Meus amigos em Erbil estavam céticos de que a visita do Santo Padre de fato aconteceria. E eu entendo o pessimismo deles como iraquianos, já que presenciaram tantos conflitos: guerras com países vizinhos, bombardeios, genocídio, a invasão estado-unidense, embargos econômicos, etc. Além disso, a perseguição aos cristãos e a outras minorias alcançou o clímax com o “reinado” de três anos do ISIS em 2014-2017.

A população cristã do Iraque vem se reduzindo, e agora está em menos de 150 mil pessoas. O número continua a diminuir à medida que as famílias cristãs são forçadas a emigrar. A economia está em crise, com o desemprego em 70%.

Mas, por enquanto, o Papa estava chegando. Eu me considero privilegiado de estar aqui neste momento para celebrar, com os cristãos desta terra abençoada, esse momento histórico.

Eu rezei por uma visita segura e bem-sucedida, e pelos seus abundantes frutos espirituais. Além disso, esperava e rezava para ter uma chance de encontrar o Papa pessoalmente – o que claramente era um pensamento ousado. As reuniões com as autoridades religiosas e civis, e as audiências de todas as denominações católicas indígenas - siríacos, caldeus, assírios - tiveram que se encaixar no calendário apertado da visita de três dias.

Algumas semanas antes da visita, presenciamos uma disparada no aumento de casos do novo variante da Covid-19; também ocorreram dois atentados suicidas em Bagdá; e foram disparados mísseis em áreas residenciais e bases militares em Erbil. Três dias antes da visita, ataques de foguetes em Bagdá mataram um civil e deixaram muitos outros feridos. O sentimento de entusiasmo que sentia com a vinda do Papa mudou automaticamente para ansiedade e receio.

Mesmo em meio a todos esses problemas, em uma audiência dois dias antes do seu voo, o Papa confirmou que agora não tinha como voltar atrás. Ele viria ao país porque os cristãos iraquianos haviam esperado muito pela sua visita.

Cinco dias antes da visita, o Pe. Nashwan, um sacerdote caldeu amigo meu e também maestro do coro da missa papal, entrou em contato comigo para perguntar várias coisas sobre o rito latino da Santa Missa. Para a minha surpresa, ele pediu para eu liderar os acólitos na missa do Papa, já que eles estavam acostumados somente com o rito caldeu, não o latino. Eu fiquei em êxtase com a notícia e rezei um “Te Deum” na hora, agradecendo a rápida resposta à minha oração.

São Josemaria sempre nos ensinou a servir a Igreja como a Igreja deseja ser servida. Eu não sou nenhum especialista em liturgia, mas estava disposto a aprender para servir o Santo Padre e a Igreja no Iraque.

Assim que soube da notícia, entrei em contato com o Pe. Vic Santos em Manila, que me ajudou a aprender a sequência, os procedimentos e movimentos para os acólitos. Ele me enviou alguns materiais sobre cerimônias para estudar – o que me acalmou muito.

A missa em Erbil foi no dia 7 de março. De manhã, ensaiamos o rito com o Monsenhor Marini, encarregado das cerimônias litúrgicas do Papa. O Pe. Janan, outro sacerdote caldeu que é meu amigo, me apresentou ao Monsenhor: “Esse é o Lito. Ele é o líder dos acólitos; é membro do Opus Dei”. Com um sinal de aprovação, o Monsenhor Marini disse “Soppra Perfetto! (super perfeito!). Eu me curvei em respeito e agradeci a Deus por esse momento e essa oportunidade.

Os acólitos e os sacerdotes esperavam a entrada do Papa na sacristia às 16h. Disseram-nos que todos teriam chance de cumprimentar o Papa pessoalmente. Mons. Marini me puxou para fora da fila e me colocou na entrada da sala onde o Santo Padre colocaria os paramentos para a missa.

O Papa Francisco chegou e apertou as mãos de cada um na fila. Quando ele se aproximava de mim, fiquei sem palavras. Estava cara a cara com o Santo Padre. Ele apertou a minha mão e a única coisa que eu consegui pronunciar foi: “Sua Santidade, meu nome é Carmelito e sou filipino”. Os olhos dele brilharam com alegria. Eu beijei suas mãos e ele entrou na sala para colocar os paramentos. A cerimônia prosseguiu e deu tudo certo.

Após a missa, eu e os acólitos estávamos novamente na passagem para a sala onde o Santo Padre iria retirar os paramentos. Mas, dessa vez, eu me recompus e me preparei para falar com ele. Assim que o encontrei, peguei sua mão direita e disse: “Sua Santidade, muito obrigado. Meu nome é Carmelito, sou filipino e adscrito do Opus Dei. Todos os dias, eu rezo e ofereço sacrifícios pelo senhor. O centro do Opus Dei em Beirute aguarda sua visita ao Líbano. Eles mandam lembranças ao senhor!” Seus olhos brilharam mais uma vez de alegria e ele disse “Sim, sim, sim!”.

Logo em seguida, eu reuni os acólitos mais uma vez na passagem onde o Santo Padre iria entrar no carro. Aplaudimos repetidamente, entoando: “Viva il Papa… Viva il Papa!”. Ele agradeceu os nossos cumprimentos com um aceno e um sorriso. Ficamos muito felizes com essa última demonstração de agradecimento do Papa aos seus acólitos.