Monsenhor Escrivá, lição de perdão

"No próximo domingo, 6 de outubro, a Igreja, em cerimônia presidida pelo papa, na Praça de São Pedro, no Vaticano, canonizará um dos grandes mestres da reconciliação: monsenhor Josemaría Escrivá, fundador do Opus Dei".

Desde a publicação de sua encíclica Dives in Misericórdia, o papa João Paulo II tem feito um constante apelo à reconciliação, "de que o homem e o mundo contemporâneo tanto precisam, mesmo sem muitas vezes o saberem". O papa afirma nesse documento que a nossa época poderá tornar-se mais humana "somente quando introduzirmos em todas as relações recíprocas, que plasmam sua fisionomia moral, o momento do perdão". Não basta a justiça. "Um mundo no qual se eliminasse o perdão seria apenas um mundo de justiça fria e irrespeitosa", sublinha o pontífice.

A paz social é uma aspiração do ser humano. Sua realização, contudo, parece distante e, frequentemente, desemboca na frustração gerada por novos e dilacerantes conflitos. Basta pensar na dramática situação do Oriente Médio.

Não obstante, o papa, armado de uma obstinação impressionante, está convencido de que a paz é possível e não depende de acordos meramente políticos, mas de algo muito mais profundo: a estratégia do perdão. João Paulo II, numa atitude de grandeza moral própria dos homens de Deus, está convencido de que só o perdão desinteressado resgatará este "mundo desconjuntado", como tristemente observava Hamlet.

No próximo domingo, 6 de outubro, a Igreja, em cerimônia presidida pelo papa, na Praça de São Pedro, no Vaticano, canonizará um dos grandes mestres da reconciliação: monsenhor Josemaría Escrivá, fundador do Opus Dei.

Muito se tem escrito sobre a amável figura do bem-aventurado Josemaría.

Gostaria de evocar um aspecto de sua vida que impressiona profundamente: sua esplêndida lição de perdão. Toda a sua vida, a sua atitude, a sua conduta constituem uma vital confirmação de que a mensagem de perdão e misericórdia do Evangelho não é um sonho utópico, um programa irrealizável neste mundo.

Há nesta terra, no coração dos santos, uma semente de amor mais forte do que a morte. Josemaría Escrivá perdoava sempre, porque sabia amar. Tinha uma imensa capacidade de amar a todos, sem distinção de raças, línguas, nacionalidades, idéias sociais, políticas ou religiosas. Conhecia uma só raça: "a raça dos filhos de Deus".

A seu lado, qualquer um se sentia compreendido. José Orlandis, professor da Universidade de Navarra, por exemplo, o considerava "o mais cordial, o mais afetuoso, o mais tocante dos homens".

"Não conheci ninguém", afirmava, "com maior capacidade de amar, de amar a todos, tendo para todos os braços abertos. Parece impossível que um mesmo homem pudesse ser, ao mesmo tempo, tão de Deus e tão profundamente humano."

O segredo, explicava Orlandis, repetindo o que tinha escutado do próprio fundador do Opus Dei, estava "em que amava a Deus e os homens com o mesmo coração de carne com que tinha amado a sua mãe e com que amava os seus filhos". Tive a mesma e inolvidável percepção da cordialidade e do carinho paterno de monsenhor Josemaría Escrivá.

Deus havia dilatado tanto o seu coração que nele cabiam folgadamente todos, mesmo aqueles que em algum momento não lhe quiseram bem e promoveram duras contradições. Ensinou, com o seu exemplo e a sua palavra, que "o Opus Dei não tem inimigos", que "não é antinada nem antininguém". Sua palavra era sempre um sinal positivo, um laço que se estendia generoso, em fraternidade universal afetiva, sem transigir com o erro, mas com afeto sincero para com todas as pessoas. Recomendava: "Não queirais mal a ninguém, nunca. (...) É preciso saber perdoar. Depois, se este ou aquele vos diz que é heroísmo, dai risada. É uma coisa esplêndida. Porventura não nos perdoa Deus quando o ofendemos? Como não havemos nós de perdoar?"

De fato, a experiência do perdão de Deus é o que nos leva a saber perdoar. E só o perdão, generoso e incondicional, é a base sólida da verdadeira paz social. Creio que a vida e os ensinamentos do fundador do Opus Dei, agora propostos pela Igreja como exemplo para todos os fiéis, constituem uma lição magnífica para os que desejam viver a experiência do perdão.

Carlos Alberto Di Franco, diretor do Master em Jornalismo para Editores e professor de Ética Jornalística, é representante da Faculdade de Comunicação da Universidade de Navarra no Brasil.

    Carlos Alberto Di Franco // O Estado de S. Paulo